Engraçado é que, em dias de chuva, a maioria das alunas costuma faltar às aulas de costura, mesmo aquelas que moram no bairro.
Muito trânsito? Curtir a chuva no aconchego dos seus lares? Talvez.
Então, como fiquei com a manhã livre e com a casa e comida já organizadas, restou-me a não fazer nada. Venho aqui escrever neste diário...
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Alguns dias antes de voltar às aulas fui estar com minha filha em São Paulo. Sabe, aquele carinho de mãe, dar uma faxina na casa, preparar pratos, cuidar das roupas, ver filmes juntas... coisa que não fiz nos dias de férias quando todos estavam juntos. Dou preferência em ir de avião porque sempre compro com antecedência, onde os preços são quase ou iguais aos dos ônibus. Nove horas dentro de um ônibus x uma hora dentro de um avião. Qual você prefere?
Por estarmos em período de fim de férias, as passagens aéreas estavam exorbitantes. Comentei com a vizinha e ela, como sempre vai de ônibus, me animou, dizendo ser uma maravilha... e eu queria tanto ir... Então eu vou. Então eu vou. Eu fui!!!
No site da companhia dizia partida apenas às 8 da manhã e chegada às 17 horas. Hum... penso, reflito... queria tanto partir bem cedinho...
Joguei umas roupinhas numa mochila e lá fui à minha aventura, como uma adolescente com cabelos ainda úmidos ao vento.
Ao entrar no ônibus retiro a mochila das costas para não atrapalhar quem vem atrás e logo avisto minha poltrona ao lado da janela, pois vou precisar de distração para aguentar 9 horas dentro de um coletivo. Do meu lado ainda não tinha ninguém. Tomara que não tenha, assim fico dona do descanso de braços. Se estou no avião, viagem curta, nem caço briga pelos cotovelos. Coloco meu braço em cima do colo.
Com os passageiros ainda se ajeitando em seus assentos, as duas poltronas à minha frente já estavam reclinadas para trás, na posição máxima. O sujeito da frente, um magrelo, esborrachado nas duas poltronas, com o boné na cara, dormindo ou fingindo dormir.
- Moço, moço, com licença? - Nada, me contorço toda para conseguir alcançar meu assento, pois não há uma "rodomoça" para orientar: "senhor, retorne o encosto da sua poltrona ". Cada um fez o que bem quis. A criança do lado gritou a viagem inteira, o outro falando alto ao celular como se estivesse dentro de um poço. Outro comendo Cheetos - aqueles salgadinhos com cheiro de vômito, como diz minha filha. Mando uma mensagem para o marido desabafando; ele me aconselha tentar dormir. Qual o quê? Bem, pelo menos vou sozinha. Hahaha!
Mas, antes do motorista fechar a porta sobe um casalzinho procurando lugar. A moça senta do meu lado e o rapaz senta ao lado de um senhor que come bolachas fazendo barulho com a boca. Bem, menomale, pelo menos uma moça vai ao meu lado - continuo trocando mensagem com o marido.
Mas o senhorzinho, tão gentil, oferece seu lugar à moça para que o casal possa ir junto abraçadinho, trocando beijinhos... Que nada, cada um pegou seu celular e passou a viagem inteira sem menos pegar na mão do outro. E eu fiquei lá, com meu pacote de irritações, pois nada mais irritante do que viajar com alguém mastigando ao seu lado. E não era só comer as bolachas, ele queria conversar, contar causos. Tratei logo de pegar o celular e fingir ler. Mas ler em movimento me dá enjoo. Faço-me de muda e cega. "Faz de conta que não estou aqui, ok?"
Coitado, ele queria ser gentil, pois a cada bolacha que retirava do pacote, me oferecia uma, mesmo com a resposta "não, obrigada". Depois das bolachas vieram as balas de tutti-frutti. Oh, senhor!
Na última parada pergunto ao motorista se faltava muito para chegar. Ele coça a cabeça e diz que, se tudo correr bem, sem chuva e trânsito, lá pelas 18 horas estaríamos entrando no terminal Tietê, em São Paulo, mas ouviu dizer que 3 carretas haviam tombado nas imediações de Bragança Paulista, sentido São paulo.
Trânsito travado, todo mundo desce do ônibus. Caminhoneiros sem camisa, crianças descalças, cada um conta um caso... Começa uma chuvinha fina... Melhor relaxar e desviar os pensamentos negativos.
Trânsito é liberado, seguimos viagem, mas a alegria não durou nem meia hora. Novo congestionamento. Senhorzinho continua me oferecendo bolachas e balas. Putz, já falei que não quero. EU NÃO QUERO!
E os pensamentos negativos vem à tona: E se me der uma crise de ansiedade? uma dor de barriga? ter um treco, ficar enjoada? Devo chamar um Uber, um helicóptero, ligar pro marido?
Não quero bolacha, nem bala. Não quero coisa nenhuma. Quero chegar em casa! E só chegamos na rodoviária às 20:30 hs. Onze horas e meia dentro de um ônibus!
Mas ao chegar no metrô, rumo a casa, tudo já havia sido esquecido. E se precisar ir de novo de ônibus, eu vou. Mas só se precisar muito.